
Martha Batalha escreve sobre luto para falar de autoconhecimento e coragem
A escritora fala sobre seu primeiro livro infantojuvenil, 'Liz sem medo', sobre infância, finitude e como a escrita a mantém conectada ao Brasil
Que a série Diário de Pilar (Pequena Zahar) é um tremendo sucesso não é novidade. Desde 2010, Pilar, a menina que viaja pelo mundo em sua rede mágica, já teve suas aventuras adaptadas para o teatro, transformadas em série animada exibida no Disney Channel, detalhadas em um canal no Youtube e ganhará em breve uma adaptação para o cinema. Na companhia de Breno e do gato Samba, Pilar já viajou por muitos países: do Egito ao Peru, da Índia à África, sem esquecer da China e da Amazônia. Agora, no mais recente lançamento da série, Diário de Pilar no México (Pequena Zahar, 2025) a menina parte para terra do sol, depois de descobrir por uma carta que uma parte de sua família vive por lá - inclusive uma avó! A nova aventura de Pilar foi o grande sucesso de vendas da Bienal do Livro no Rio de Janeiro, que aconteceu este ano entre os dias 14 e 22 de junho.
A nova aventura de Pilar, Breno e o gato Simba se passa na Cidade do México
Pilar é uma criação de Flávia Lins e Silva, que também é a autora por trás da série Os detetives do prédio azul (Pequena Zahar), e ganhou contornos pelas aquarelas de Joana Penna, que também ilustra Liz sem medo (Escarlate, 2024), de Martha Batalha. Assim como Pilar, Joana é uma fã dos diários de viagem desde sempre, antes mesmo de ser ilustradora de livros. Em entrevista ao Blog Letrinhas, ela conta um pouco sobre isso e fala dos bastidores de Diário de Pilar no México. Em um vídeo gravado em seu estúdio, na Califórnia (EUA), onde vive com sua família, Joana mostra seu próprio diário de viagem para o México, onde registrou toda a pesquisa feita para o livro - e todos os objetos e referências que a inspiraram.
Joana Penna: Eu sou formada em Design Gráfico e comecei a fazer ilustrações ainda na faculdade. Meu trabalho final foi sobre o design do livro infantil, que é o que me encantou desde o princípio. Depois de formada, fui passar um ano em Barcelona (Espanha), que foi o lugar onde eu realmente “soltei a mão” e comecei a desenhar todo dia. Foi lá que aprendi a desenhar sem medo de errar com caneta. Falo muito sobre isso nas lives que eu organizo apresentando cinco regras para desenhar sem medo. O principal é aprender a lidar com a frustração e deixar fluir - acho que esse foi o meu grande caminho das pedras. Aceitar a imperfeição, o meu traço e deixar o desenho vir.
Joana Penna: O que eu faço nos meus diários é justamente isso: desenhar com canetas. Quando eu comecei a viajar pela Europa, percebi que eu queria documentar mais do que a fotografia era capaz de registrar. Me interessa muito esse dia a dia, os lugares em que eu fiquei, onde eu comi, gosto de anotar coisas…
Quando você tira uma foto é muito rápido. Mas quando você para para desenhar, é um outro processo de absorção, de memória, que muda a sua relação com o lugar, Quando você desenha, você presta muito mais atenção aos detalhes. Cadernos de viagem são quase um esboço - tem erros de desenhos, tem post its, tem anotação…
Então, eu carregava comigo sempre um bloco de aquarela com caneta permanente resistente à água. E assim comecei a fazer os meus diários de viagem. Só que logo me dei conta de que nas lojas nunca encontrava o bloquinho perfeito - com a quantidade de páginas, o tipo de papel, o tamanho que eu gostaria… Então comecei a encadernar meus próprios cadernos de viagem, pensando no que fazia sentido para cada destino. Mais tarde, quando fui morar em Londres e Nova York, fiz mil cursos de encadernação. O resultado é que eu tenho uma coleção de diários de viagem! Tem uns bloquinhos micros - como o que eu comprei na Itália e cabia no bolso. E tem outros grandes… Fiz um caderno enorme para o Nepal!
E tem um detalhe: eu nunca escolho a capa do diário antes da viagem. E sempre me aparece a capa perfeita. Sei que na viagem eu vou encontrar a capa certa.
Joana Penna: Quase todos! Eu tenho muitos diários de viagem porque eu e meu marido moramos por seis anos na Ásia, em uma época em que éramos recém-casados e ainda não tínhamos filhos [Joana é mãe de dois], por isso viajamos muito. China, Egito e Índia são alguns dos lugares pelos quais a Pilar passou e eu já conhecia. Já Machu Picchu, no Peru, e México foram lugares para os quais eu viajei especificamente para fazer a pesquisa dos livros.
Joana Penna: É verdade! Íamos para a Bolívia em um feriado de Ação de Graças [Joana mora nos EUA, país onde se celebra o feriado de Ação de Graças sempre na quarta quinta-feira do mês de novembro], mas quando a Flávia me avisou que o próximo destino da Pilar era o México, mudei tudo. Sorte que a Flávia decidiu que a história ia acontecer apenas na Cidade do México, porque senão não teria como fazer tudo, não ia dar tempo… Lembro que a Flávia me mandou o livro inteiro, antes de ser revisado. Tive que ir em uma loja para imprimir, encadernar, e fui lendo no avião e anotando onde tinha que ir. Foi assim que eu fiz o meu roteiro. E foi incrível porque eu pude realmente visitar todos os lugares por onde a Pilar ia passar na história.
Por coincidência, eu tenho uma super amiga mexicana, a Cláudia, que tinha um apartamento disponível bem na data da nossa viagem. Ela foi uma amiga que eu fiz na época em que morei no Sri Lanka. E a melhor amiga dela, a Alicia, foi quem me deu todas as dicas, de onde ir, onde comer… Na ilustração do barquinho, eu coloquei o nome das duas.Também coloquei “Maria”, que é minha irmã, e “Beatriz”, nome da minha mãe. Como o costume é colocar nomes de mulher nos barcos, aproveitei para fazer essas homenagens colocando alguns easter eggs [elementos escondidos que são uma surpresa para o leitor] na história.
As ilustrações de Joana Penna misturam desenhos feitos a caneta e pintados com aquarelas a fotos que trazem mais informação às imagens, adicionando texturas
Joana Penna: Eu tirei mais de 3500 fotos com o celular. Fiz uma extensa pesquisa iconográfica. Fui em “mil” mercados, ao Museu de Antropologia. Na história, acontece o sumiço de uma peça desse museu, do deus Quetzalcóatl ["uma estátua do tamanho de uma almofada, que parecia uma cobra com penas, toda enroscada
− outra representação do famoso Quetzalcóatl" como descreve o livro]. Eu fiquei horas para escolher uma peça desse deus que tivesse um tamanho suficiente para ser roubada. Tinha essa preocupação de ser coerente para que uma criança que conhecesse a história e fosse ao museu pudesse achar a peça. Eu tive que procurar outras peças que ela menciona no livro - como o colar do Montezuma,que eu fiquei um tempão procurando e a pedra do sol.
Por causa da minha pesquisa toda sobre o México, sugeri à Flávia que incluísse no livro Teotihuacán [centro urbano localizado a 48 km da Cidade do México] que tem uma tradição muito forte nas celebrações do Día de los Muertos, com festas nos cemitérios e outros rituais.
No meu processo de ilustração dos Diários de Pilar, sempre vou desenhando tudo a caneta e depois pinto com aquarela. E tem sempre um trabalho de colagem digital, que eu faço depois da pintura. Quase todas as roupas são de fotografias tiradas na viagem e também as bandeirinhas coloridas, que marcam as celebrações de Día de los Muertos. Tudo o que eu gosto de preservar a textura, eu prefiro fotografar.
Joana Penna: Para a capa do diário do México, eu comprei um tecido que é uma bolsinha que eu vou desmontar por inteiro.
O diário que fiz no México é o único que eu terminei de pintar de cabo a rabo, já tem até uma caixa com uma capa de desenhos da Frida Kahlo. Quase todos os meus diários de viagem ainda estão inacabados. Quando eu chego de volta em casa, entre um trabalho e outro, eu vou colorindo. Tem uns que eu nem encadernei a capa ainda…
Joana Penna: Eu e Flávia temos uma amiga em comum, a Jaqueline, que sempre dizia que eu precisava ilustrar as história da Flávia - e dizia o mesmo para ela. A história da Pilar já estava pronta há tempos, na verdade. Mas teve um momento em que a Flávia resolveu refazer os livros em forma de diário, e então ela foi atrás de mim. A gente teve a primeira reunião em um Café em Nova York, já com lápis e papel na mão. Foram muitos esboços até chegarmos à personagem principal.
Os Diários de Pilar são meu grande xodó, o trabalho da minha vida. Eu amo desde toda a parte da pesquisa até o sucesso que virou nos últimos anos. Escuto de muitas famílias que a Pilar é a porta de entrada para um universo da leitura e eu não poderia ficar mais orgulhosa.
(Texto: Naíma Saleh)
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